Postal colorido cerca de 1900, arquivo da Gazeta de Miaflores |
"Passa por este vale a Primavera
As aves cantam plantas enverdecem
As flores pelo campo aparecem
O mais alto do louro abraça a hera
Abranda o mar menor tributo espera
Dos rios que mais brandamente descem
Os dias mais formosos amanhecem
Não para mim que sou quem d´antes era
Espanta me o porvir temo o passado
A magoa choro d´um d´outro a lembrança
Sem ter já que esperar nem que perder
Mal se pôde mudar tão triste estado
Pois para bem não pôde haver mudança
E para maior mal não pôde ser"
Frei Agostinho da Cruz sobre a região e o convento de São José 1580
Tivemos conhecimento à uns dias, de que a propriedade onde se insere o "nosso" querido convento de São José em Algés voltou a ser posto à venda no mercado internacional por 25 milhões de euros, o que nos indica que a RAR Imobiliária e o seu Fundo Especial de Investimento Imobiliário Fechado, SÃO JOSÉ DE RIBAMAR, se desinteressaram de ir avante com o projecto.
Queríamos com este artigo, voltar a chamar a atenção para o processo menos claro que envolveu esta propriedade desde há coisa de 20 anos para cá.
O convento e a capela de São José de Ribamar em Algés são "apenas" o conjunto edificado mais antigo da região de Algés, sendo a sua capela uma das mais antigas do concelho de Oeiras, assim sendo é um património muito importante para a história de Oeiras e de Lisboa. é também muito acarinhado pela grande maioria dos algesinos, muitos foram os que ali se casaram, foram baptizados e viram os velórios dos seus familiares serem ali celebrados, havendo até quem ainda tenha memórias de antepassados seus ali terem sido sepultados, é portanto com toda a lógica, um património classificado por edital camarário e esta isento de IMI por vias de ser suposto o seu proprietário actual (Fundo Especial de Investimento Imobiliário Fechado, SÃO JOSÉ DE RIBAMAR), vir a efectuar a conservação e a recuperação dos imóveis. Acontece que, a propriedade esta fechada a sete chaves à quase 10 anos e há 15 que não é alvo de qualquer tipo de obra de conservação ou restauro, tendo chegado os imóveis a uma situação de pré ruína, como demonstramos no vídeo recolhido em 2014 e que publicamos no final deste artigo.
Uma breve história do Antigo Convento de S. José de Ribamar
1961 Capela do Palácio do Conde da Foz (Convento São José de Ribamar), fotografia de Arnaldo Madureira |
O convento de S. José de Ribamar foi fundado em 1559 por Dom Francisco de Gusmão, fidalgo cavaleiro da Casa da infanta D. Maria, e sua mulher Dona Joana de Blasbelt. A igreja foi dedicada a S. José. O convento inicial, de construção precária, ruiu em 1595, sendo posteriormente reconstruído. No início do século XVII, Dom Pedro Castilho (bispo inquisidor-geral) mandou fazer a sacristia e reedificar a casas do cardeal. Mais tarde, em 1617, foi construída a casa do capítulo, a abobada da igreja e aumentado o número de celas, tendo agora o convento a capacidade para 30 frades. Nos finais do século XVII, era venerada por muita gente uma imagem do Menino Jesus que havia na sacristia do convento. Com a extinção das ordens religiosas em 1834, o convento e as suas terras foram vendidas a José Marques da Costa soares. Em 1872, o conde de Cabral comprou a propriedade e o velho convento foi transformado em palacete para habitação. São do século XIX as muralhas que suportam as terras de Ribamar, o torreão e as duas guaritas. Actualmente, o antigo convento e posteriormente palacete conserva ainda elementos arquitectónicos e paisagísticos de grande interesse histórico e artístico. A igreja, a sacristia e o claustro, os painéis de azulejo e o palacete de arcarias estão enquadrados pelos belos jardins com vegetação exótica e rara (dragoeiros, palmeiras e outras espécies).
CLASSIFICAÇÃO: Imóvel de valor concelhio, de acordo com o Edital nº 184/2004 (2ª série), publicado no Diário da Republica Nº 67, II Série, 19 de Março de 2004.
1961 fotografia de Arnaldo Madureira |
1961 fotografia de Arnaldo Madureira |
O processo negocial
Arquivo da CMO |
Para que se perceba bem os contornos esquivos e obscuros que envolveram a negociação deste projecto entre a CMO, a antiga Freguesia de Algés e a RAR Imobiliária, temos de recuar ao ano de 2008, altura em que o projecto foi apresentado em Oeiras para aprovação. A Câmara de Oeiras autorizou então a transformação da Quinta de São José de Ribamar, e do antigo convento do século XVI junto à marginal, em Algés, num condomínio de luxo. As únicas vozes que se levantaram contra este processo menos claro foram as da vereadora Isabel Meireles do PSD que mencionou "o atentado ao património", e a do vereador Amílcar Campos da CDU que mencionou que "Algés vai ficar mais pobre com as alterações à Quinta de S. José de Ribamar".
O processo negocial entre a RAR Imobiliária (empresa que em 2012 tinha previstos investimentos de 175 milhões em imóveis históricos), a junta de Freguesia e a CMO foi no mínimo estranho, uma vez que tendo a edilidade oeirense, depois de ter recusado a sua aquisição, todas as ferramentas para acautelar um futuro risonho para este património tão importante para a região, estranhamente conduziu o processo negocial para um claro favorecimento dos interesses da RAR Imobiliária em detrimento dos interesses camarários e dos habitantes da Freguesia de Algés.
Nesse dito "processo negocial" A Freguesia e a CMO pela mão dos seus presidentes, decidiram, à revelia dos habitantes que, este património único passa-se a ser visitável apenas pelos moradores das 22 habitações que ali seriam construídas, deixando nas mãos dos proprietários a autorização, ou não de visitas ao claustro ou à capela, "Poderá ser pensado um horário para o claustro e a capela serem visitados pelo público em geral, caso os condóminos o permitam", disse um responsável da imobiliária.
Abriram-se portanto as portas ao elitismo e à passagem dos direitos sobre o património classificado para as mãos de privados tendo como contrapartida a Câmara de Oeiras para aprovar a obra ... a construção de um passadiço entre a quinta (para utilização dos moradores das 22 habitações) e o terraplano de Algés, facilitando o acesso dos condóminos e da população em geral ao Tejo, ora, se isto é um processo negocial bem conduzido ou não, deixo à vossa consideração... Eu, apenas consigo compreender tal procedimento como tendo contornos obscuros que deveriam até ser investigados pelas autoridades. Lembro que na altura O presidente da edilidade oeirense, Dr. Isaltino Morais, mostrou-se pouco satisfeito com as críticas do PSD e da CDU, apesar de elas não terem tido peso suficiente para alterar a deliberação de viabilizar o empreendimento imobiliário. O deputado da CDU Amílcar Campos, que defendia a aquisição da propriedade pela edilidade oeirense, referiu na altura que, "Esta foi uma má opção urbanística da Câmara de Oeiras" e "Se tivesse adquirido este património, toda a população poderia usufruir dele. Assim, fica apenas para 22 privilegiados", não poderia estar mais de acordo com esta tomada de posição.
O projecto
O projecto ficou a cargo do arquitecto Gonçalo Byrne.
Terá uma altura máxima de três andares e construídos em banda, a maioria dos apartamentos, T4 e T5+1, surgirá nos terrenos outrora destinados à agricultura. O projecto está orçado em 20 milhões de euros e inclui 78 lugares de estacionamento subterrâneo, além de uma piscina.
Três habitações irão reutilizar o património histórico: uma será construída à volta do claustro, outra junto a um antigo pátio e uma terceira nas cavalariças. Os jardins serão integralmente recuperados, bem como a capela, o claustro, um pátio interior, uma antiga instalação dedicada à lavoura e as cavalariças, além da muralha circundante da quinta.
As obras deveriam ter sido iniciadas no segundo semestre de 2010, estimava-se na altura que o valor de venda dos apartamentos rondasse os quatro a cinco mil euros o metro, o projecto esta neste momento caducado na CMO
Conclusões
Torna-se evidente que a empresa detentora da propriedade, especialista nestas questões, uma vez que tem larga experiência no mercado imobiliário de edifícios históricos, apenas apresentou o projecto para se manter isenta do pagamento de IMI e ir adiando o processo de manutenção e restauro dos imóveis classificados, Desde 2008 que o projecto se arrasta, estando nessa data já a propriedade abandonada à vários anos. Oito anos depois do projecto aprovado, chegam-nos notícias da tentativa de venda no mercado internacional, dando-nos indicações que a empresa não vai levar avante o projecto.
Estamos portanto segundo a minha visão, perante um plano de destruição e apropriação do património único que constituí este convento e a sua área envolvente, com a conivência estranha da edilidade oeirense, seria interessante um amplo debate à volta desta questão, que penso a grande maioria dos algesinos desconhecia. Tirando tudo por miúdos, a verdade é que o Convento de São José de Ribamar apodrece há coisa de 15 anos para cá e as entidades responsáveis olham para o lado e assobiam, apesar de terem responsabilidades perante a legislação em vigor.
Video de Nuno Afonso para a Gazeta de Miraflores sobre o estado dos imóveis em Dezembro de 2014
Os responsábeis da urbanização desta região de Oeiras, entre Algés e o Dafundo, ainda não alcançaram a capacidade de apresentar um projecto embelezamento e utilização deste maravilhoso espaço, que poderia dar continuidade à Alameda Hermano Patroni e assim contribuir com um património natural para recreio e cultura em vez de um projecto de lucros financeiros.
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