segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

A Capela do Convento de São José de Ribamar




 O convento de S. José de Ribamar foi fundado em 1559 por Dom Francisco de Gusmão, fidalgo cavaleiro da Casa da infanta D. Maria, e sua mulher Dona Joana de Blasbelt. A igreja foi dedicada a S. José. O convento inicial, de construção precária, ruiu em 1595, sendo posteriormente reconstruido. No início do século XVII, Dom Pedro Castilho (bispo inquisidor-geral) mandou fazer a sacristia e reedificar a casas do cardeal. Mais tarde, em 1617, foi construída a casa do capítulo, a abobada da igreja e aumentado o número de celas, tendo agora o convento a capacidade para 30 frades. Nos finais do século XVII, era venerada por muita gente uma imagem do Menino Jesus que havia na sacristia do convento. Com a extinção das ordens religiosas em 1834, o convento e as suas terras foram vendidas a José Marques da Costa soares. Em 1872, o conde de Cabral comprou a propriedade e o velho convento foi transformado em palacete para habitação. São do século XIX as muralhas que suportam as terras de Ribamar, o torreão e as duas guaritas. Actualmente, o antigo convento e posteriormente palacete conserva ainda elementos arquitectónicos e paisagísticos de grande interesse histórico e artístico. A igreja, a sacristia e o claustro, os painéis de azulejo e o palacete de arcarias estão enquadrados pelos belos jardins com vegetação exótica e rara (dragoeiros, palmeiras e outras espécies). 

CLASSIFICAÇÃO: Imóvel de valor concelhio, de acordo com o Edital nº 184/2004 (2ª série), publicado no Diário da Republica Nº 67, II Série, 19 de Março de 2004.



1961 Capela do Palácio do Conde da Foz (Convento São José de Ribamar), 
fotografia de Eduardo Portugal


O estatuto dos frades arrábidos (que dos franciscanos eram os de regras mais apertadas) — dispunha que as igrejas de seus conventos não podiam ter de comprimento mais que oitenta palmos, medidos da porta de ingresso até a parede de fundo do altar-mór. Pois a de São José de Ribamar em Algés era mais pequena. Tinha, porém, três altares, — o principal e dois colaterais. No altar-mór estavam duas imagens muito veneradas, uma de cada lado do sacrário — a de Nossa Senhora da Conceição, cuja festa era custeada pelo conde de Aveiras, D. João da Silva Telo (o que vendeu o palácio de Belém ao Senhor D. João V) e a de S. José — padroeiro da casa — que todos os anos, a 19 de Março, era objecto de devota festividade promovida pelos condes de Santa Cruz, depois marqueses de Gouveia e mais tarde duques de Aveiro, família que veio a ter um dos fins mais trágicos que a nossa História regista. No retábulo, de boa obra de talha, que ainda existe embora deslocado de seu primitivo lugar, veneravam-se, cada qual em seu nicho, mais quatro imagens — a de S. Francisco das Chagas, que era festejado pelo proprietário do cargo de provedor da Alfândega; a do portuguesíssimo Santo António, cuja festa corria por conta da casa dos condes de Castelmelhor; a de S. Luiz, bispo de Tolosa, de quem se não esqueciam os marqueses de Nisa; e, finalmente, a do grande reformador e instituidor dos arrábidos, S. Pedro de Alcântara, o qual, no curioso dizer do cronista, «se contentava com a solenidade da Província».
 Nos outros altares viam-se: no do lado da Epístola, S. João Baptista e no da banda do Evangelho, a milagrosa imagem do Menino Jesus, que fôra dádiva do sexto conde de Portalegre, D. Diogo da Silva, que aí estava sepultado. - A imagem do santo padroeiro da casa era famosa para, por sua intercessão, se alcançar sucessão nos matrimónios. Dera-a Dona Filipa de Sousa, mulher de Diogo das Póvoas, que foi provedor da Alfândega de Lisboa. Este casal aspirava a ter um herdeiro, mas as suas pretensões sempre se haviam malogrado e, por isso, já desesperavam de o alcançar. Logo que a bem-dita imagem de S. José foi colocada no altar, Dona Filipa implorou seu valioso patrocínio para o deferimento, pelo Altíssimo, de seu maior desejo e, diz a história, obteve o almejado despacho tendo, meses depois, a Luiz das Póvoas, que lhe sucedeu no morgadio. Este facto tornou-se conhecido e levou muita gente a apegar-se com o Santo Patriarca para conseguir a fructificação de seu leito.

1961 Entrada para a capela do Palácio do Conde da Foz (Convento São José de Ribamar), fotografia de Arnaldo Madureira


 Não resisto à tentação de contar-lhes uma história curiosíssima, embora me arrisque a não ser novidade.
 Dona Maria Francisca Isabel de Sabóia, que foi Rainha de Portugal e (por via de seu matrimónio com o Senhor D. Afonso VI ter sido anulado) depois Princesa Regente, porque a razão de Estado a obrigou a desposar seu cunhado, D. Pedro — Dona Maria Francisca, ia dizendo, para assegurar-se da ventura de dar sucessão ao Reino, prometeu uma novena de sábados a S. José de Ribamar, quer dizer: prometeu vir nove sábados consecutivos a fazer suas orações perante a milagrosa imagem do Santo patrono do convento. E deu começo à devota promessa ao mesmo tempo que uma outra senhora, fidalga e titular que, andava cumprindo idêntico fadário. No segundo sábado, porém, sucedeu coisa estranha e que deu muito que falar. A fidalga chegou mais cêdo e, como encontrou a porta da igreja fechada, foi em busca do irmão porteiro para que lha abrisse. Ele não se fez rogado e acudiu prestes, mas... por mais voltas que desse à chave não conseguia que ela pegasse nas guardas da fechadura. Teimou, empenhou-se na tarefa, porfiou, suou, empregou todos os esforços, chegou mesmo a pecar e a transgredir os preceitos da Ordem (perdendo a paciência e irando-se contra a engrenagem), mas a fechadura a nada se moveu e a senhora teve de contentar-se em fazer as suas orações desde o alpendre e regressar casa, com negros pressentimentos sobre o futuro da sua aspiração. O frade, porém, ficou-se mortificado até a medula...  porque o bergantim em que viajava a esposa do Príncipe Regente, D. Pedro, já se avizinhava na praia. A excelsa visitante desembarcaria brevemente e a maldita da fechadura seguia apostada em desfeitear as visitas, por mais alta que fosse sua hierarquia. E o bom do arrábido, cada vez mais perturbado, não atinava com uma saída airosa para tão grave embaraço. Até que tomou a resolução heróica de ir falar ao padre guardião a pedir-lhe licença para arrancar a engrenagem. No entretanto chegava Sua Alteza... e o frade, atrapalhado, inconscientemente, pela força do hábito, fez, mais uma vez, menção de abrir a porta dando a volta à chave... Mas... ¡oh prodígio! ... ¡oh maravilha! ... A fechadura obedecera suavemente, funcionara como se estivesse untada de fresco e a porta, girando nos fortes gonzos, ¡patenteou a entrada franca a Dona Maria Francisca Isabel de Sabóia! O caso foi faladíssimo e não faltou quem o interpretasse no sentido da Princesa encontrar aviamento a sua pretensão e da concorrente vê-la malograda. Os factos vieram, na devida altura, demonstrar o acerto dos vaticínios. No dia de Reis do ano seguinte (1669), as náus de guerra e todas as fortalezas salvavam. Todos os sinos de Lisboa repicavam festivos e, em acção de graças, o verbo assombroso de António Vieira reboava sob as abóbadas da Capela Real de Santo Tomé, nos Paços da Ribeira. é que a novena de sábados, que a Sereníssima Princesa levara a cabo ante a prodigiosa imagem de S. José de Ribamar, sempre alcançara bom despacho. Acabara de nascer uma menina que, a 2 de março seguinte, conduzida nos braços do chique de Cadaval, D. Nuno Álvares Pereira de Melo, iria a baptizar pelo bispo de Targa, D. Francisco Sôtomaior, sendo padrinho Luiz XIV — o Rei Sol — representado por seu embaixador na Côrte, o padre Saint-Romain. Essa menina era a Princesa Dona Isabel Luiza Josefa que chegou a ser jurada herdeira da coroa portuguesa, antes que seu Pai tivesse de seu segundo matrimónio (e sem a mediação de S. José...) o futuro D. João V.


Princesa Dona Isabel Luiza Josefa

1 comentário:

  1. Belo artigo, um excelente complemento de um outro sobre a questão imobiliária.
    Hoje, 21/3/2018 ao passar pelos portões de acesso, vi o vigilante e perguntei se se podia visitar os terrenos. Para além da antipatia do sujeito, descartou-se a hipótese de visitas. "Só para comprar e mais nada". Um património destes a degradar-se à vista de todos e com a impotência de se poder fazer algo.

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